domingo, 11 de março de 2012

A importância do desenho na pré-escola




Crianças em idade pré-escolar adoram desenhar. Traçam círculos imaginários com canudinhos, usam o dedo para rabiscar o vidro embaçado do carro, fazem cenários na areia. Quando têm acesso ao lápis, então, é uma festa. O desenho é uma das formas de expressar o que sentem e pensam sobre si mesmas e o mundo. "Elas passam a entender melhor suas emoções e a mostrar sua interpretação dos valores, conceitos e normas da sociedade, bem como expressar carinho pelos amigos e familiares. Além disso, descobrem que é possível inventar e fantasiar. "Qualquer um pode criar um super-herói".Mas é possível ensinar a desenhar? Desde o século 19, duas escolas se alternaram no dia-a-dia: a tradicional, segundo a qual as crianças devem copiar modelos, e a renovada, que defende que eles não precisam de orientação. Hoje, o modelo contemporâneo propõe que o melhor é instigá-los a criar partindo do conhecimento do mundo da arte e da cultura visual. É o que os especialistas chamam de "desenho cultivado". No livro O Desenho Cultivado da Criança: Prática e Formação de Educadores, Rosa Iavelberg, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), comenta essas mudanças.

Segundo ela, a escola tradicional pregava que, por não saber desenhar, as crianças precisavam treinar habilidades e cópia para chegar ao referencial de imagens figurativas, cada vez mais próximas da realidade e dos modelos da arte adulta. Nessa época, só havia espaço para a reprodução técnica, marcada pela impessoalidade dos aprendizes, que imitavam formas externas e preconcebidas. Imagens de bichos e objetos também eram apresentadas como atalhos para o ensino de números: a haste de um guarda-chuva virava o 1, a curva do pescoço de um cisne transformava-se no 2. Essas propostas acabaram superadas porque impunham um ponto de vista adulto sobre a aprendizagem sem levar em conta o saber da criança.
As primeiras leituras na pré-escola
Fazer de cada criança um leitor requer atividades diárias em que a garotada tenha a oportunidade de ler, trocar idéias, comentar notícias e muito mais


É dever de todo professor, desde a Educação Infantil, incentivar o desenvolvimento de comportamentos leitores antes mesmo de a turma aprender formalmente a ler. Comentar ou recomendar algum texto, compartilhar a leitura de um livro, confrontar idéias e opiniões sobre notícias e artigos com outras pessoas - tudo isso ajuda a estabelecer gostos, reconhecer finalidades dos materiais escritos, identificar-se com o autor ou distanciar-se dele, assumindo uma posição crítica. No mundo todo, crianças que vivem em ambientes alfabetizadores (ou seja, aqueles em que as pessoas fazem uso regular do ato de ler e escrever) têm a oportunidade de construir esse conhecimento naturalmente ao imitar as ações dos parentes e amigos. Já os que não vivem cercados de "letras" precisam (e muito) da ajuda da escola. O fato é que essa ainda não é a realidade do nosso país. Os números do Censo Escolar 2005, feito pelo Ministério da Educação, revelam que apenas 19,4% dos colégios públicos do Ensino Fundamental têm biblioteca: só 27 815, de um total de 143 631 unidades.

Daí a importância de iniciar esse trabalho ainda na Educação Infantil. Além de aproximar as crianças do mundo letrado, a leitura alimenta o imaginário e incorpora essa experiência à brincadeira, ao desenho e às histórias que todos os pequenos gostam de contar. Não é raro ver bebês manuseando livros, apreciando as ilustrações e até virando as páginas, como se estivessem realizando uma leitura silenciosa. Isso é mais uma prova de que é possível formar comportamentos leitores desde muito cedo. Para os menores de 3 anos, é fundamental escolher atentamente as obras por causa das imagens: elas precisam ser grandes, claras e atraentes, pois estimulam a participação. "Ler para as crianças é igualmente importante para elas se familiarizarem com o hábito da escuta. Os temas, é óbvio, devem estar de acordo com os interesses mais genuínos da idade, como afazeres cotidianos, bichos etc.", .

As crianças especiais, com os deficientes físicos precisam de rampas para se locomover, os deficientes auditivos e mentais também precisam de ferramentas para participar de atividades de leitura. "Não podemos deixar que essa criança só participe da aula. Se ela é surda, trabalhe com livros cheios de figuras. Se ela tem uma deficiência mental e não consegue se concentrar, dê um exemplar para ela acompanhar a tarefa.
As primeiras leituras na pré-escola
Fazer de cada criança um leitor requer atividades diárias em que a garotada tenha a oportunidade de ler, trocar idéias, comentar notícias e muito mais
Ao alcance de todos

Para formar futuros leitores, é fundamental que a leitura faça parte da rotina diária. O ideal é que não só a escola disponha uma biblioteca mas também todas as salas tenham espaço reservado para livros, revistas e outros materiais impressos - onde todos possam manusear o material livremente e comecem a entender o sentido que o mundo letrado tem para todas as pessoas já alfabetizadas. Por isso, os especialistas dizem que não cabe exigir atividades complementares depois da leitura. Ao contrário. Nessa fase, é melhor não escolarizar a tarefa e esperar algum resultado da parte das crianças. Portanto, nada de questionários sobre a história. O melhor é bater papo e trocar impressões sem compromisso. Ao estabelecer como rotina que cada texto lido seja seguido de perguntas preestabelecidas, você pode criar a sensação de que o ato de ler está necessariamente vinculado a essas respostas (ou à produção de desenhos), o que não é verdade.
"O que fazer depois da roda de leitura deve estar a serviço da construção desse comportamento. Conversar sobre as impressões de cada um abre espaço para que as crianças digam do que mais gostaram ou lembrem de algum episódio já vivido e, assim, se apropriem do uso social do ler e  serviram para formar leitores. A proposta é   produção de desenhos sobre temas livres e datas comemorativas e construção de pequenos livros . Havia também uma mistura entre o ato de ler e o de contar histórias. A solução é mudar as práticas em sala para aproximar as crianças dos diferentes gêneros literários e mostrar como há importantes distinções entre a linguagem escrita e a falada. Hoje, as professoras devem explicar claramente o motivo pelo qual aquele texto foi escolhido e, durante a leitura, respeitam a versão original, não substituindo palavras nem simplificando a narrativa .Ao fazer leituras em voz alta, o professor obtém vários benefícios, que são o que os especialistas chamam de desenvolver comportamentos leitores:
- permitir a interação da garotada com as práticas de leitura,
- fazer com que todos se aproximem e se familiarizem com a linguagem escrita,
- aumentar a curiosidade pelos livros e outros materiais escritos,
- mostrar as diferenças entre a linguagem escrita e a oral,
- ampliar as referências literárias,
- e mostrar que a leitura é sempre fonte de prazer e entretenimento.

E então, vamos começar a promover cada vez mais atividades de leitura para a turma?
O segredo está na entonação
Escolher títulos de qualidade literária aumenta o interesse
 Sempre que poder, se fantasia, usa fantoches, monta um verdadeiro teatro - tudo para garantir um interesse maior do grupo, já que se manter concentrado não é exatamente o forte nessa faixa etária. Por isso, a atividade dura de cinco a 15 minutos, no máximo. À medida que o ano vai avançando, a garotada se familiariza com esse momento e passa a esperar por ele. "Tem mãe que conta que o filho junta os bonecos, faz uma roda e começa a contar uma história com o livro na mão, imitando o que ocorre na sala.
Além de escolher bons títulos, privilegiando sempre a qualidade literária é  a chave para obter sucesso em atividades de leitura com classes de Educação Infantil é a entonação. Quando estiver lendo, altera a voz a cada mudança de personagem. E ensine: as obras precisam ser manuseadas livremente pelas crianças. "No início, muitos nem sequer conhecem livros e mordem, amassam, empilham. Mas, se a escola não der essa oportunidade aos pequenos, quem vai dar?", pergunta. Ao ampliar a curiosidade da turma pelo material escrito, a professora permite que todos comecem a entender o sentido das práticas de leitura, se aproximem do mundo das letras e ganhem familiaridade com ele.
Literatura na Educação Infantil: para começar, muitos livros
Garantir o contato com as obras e apresentar diversos gêneros às crianças pequenas é a principal função dos professores de creche e pré-escola para desenvolver os comportamentos leitores e o gosto pela literatura desde cedo
Todos os especialistas concordam que, num país como o Brasil, a escola tem um papel fundamental para garantir o contato com livros desde a primeira infância: manusear as obras, encantar-se com as ilustrações e começar a descobrir o mundo das letras. É nas salas de Educação Infantil que você, professor, deve apresentar os diversos gêneros à turma. Nessa fase, o que importa é deixar-se levar pelas histórias sem nenhuma preocupação em "ensinar literatura". Ler para os pequenos e comentar a obra com eles é fundamental para começar a desenvolver os chamados comportamentos leitores.

Por que ler
Mesmo antes de aprender a ler, as crianças devem ser colocadas em contato com a literatura. Ao ver um adulto lendo, ao ouvir uma história contada por ele, ao observar as rimas (num poema ou numa música), os pequenos começam a se interessar pelo mundo das palavras. É o primeiro passo para se tornarem leitores literários - percurso que vai se estender até o fim do Ensino Fundamental.

Quem lê
Como a maioria das crianças de creche e pré-escola não é alfabetizada, a leitura deve ser feita pelo professor. Mas é essencial deixar que todos manipulem os exemplares. Incentive-os a folhear as páginas, observar as imagens e os textos e levar as obras para casa.

Como ler
Existem dois modelos básicos: o contato pessoal da criança com o livro, como foi explicado acima, e a roda de leitura, em que o professor lê para toda a turma. Nesse caso, é preciso sempre planejar a atividade, da escolha do texto às formas de interação. "A apresentação, a seleção e a preparação prévias, os motivos explicitados, a consideração do leitor, o incentivo aos comentários posteriores e o clima criado devem ser intencionais, e não da mesma forma, o momento da leitura exige postura adequada, entonação de voz e uso correto das ilustrações para ajudar a conduzir a narrativa. No fim, é muito importante coletar as impressões da garotada, o que pode ser feito com perguntas simples: de qual parte da história cada um mais gostou (e por quê), o que chamou mais a atenção em cada personagem, qual ponto provocou mais alegria (ou medo, preocupação etc.). Esse momento de pensar sobre o que foi lido e expressar opiniões é um comportamento típico de quem gosta de ler - e vale para toda a vida. E não se esqueça de que essas opiniões podem (e costumam) ser diferentes. Essa troca também é boa para estimular os pequenos a aprender a ouvir o que os outros têm a dizer.

Desenho espontâneo


Já a escola renovada do século 20, cujos principais estudiosos foram o francês Georges-Henri Luquet, o austríaco Viktor Lowenfeld e a norte-americana Rhoda Kellogg, via na produção infantil uma forma de entender o desenvolvimento psicológico. Assim, passou-se a valorizar o chamado desenho espontâneo, no qual o professor não podia intervir - bastava criar as condições adequadas para cada um se expressar. Coinfluenciado pelas idéias de Jean Piaget, Luquet defendeu, em 1913, que as crianças têm um "modelo interno" e por isso não copiam os objetos da maneira pela qual os percebe, mas transfigura-os com base nas próprias referências. Lowenfeld segue na mesma linha em Desenvolvimento da Capacidade Criadora, livro de 1947: "O desenho, a pintura ou a construção constituem processos complexos, nos quais a criança reúne diversos elementos de sua experiência para formar um conjunto com um novo significado". Segundo ele, o educador teria a função de ampliar a sensibilidade e aguçar os sentidos da garotada, já que "o homem aprende através dos sentidos".

Na segunda metade do século 20, Rhoda Kellogg pesquisou mais de 300 mil desenhos infantis. Entre outras coisas, descobriu que há muitas representações parecidas de casas, árvores e seres humanos. Para ela, essa constatação é um indício de que o impulso criativo é uma herança comum a toda a humanidade, não restrita a uma cultura ou um país. Rhoda defendeu que a criança é autodidata e que, se não houver interferência inadequada do adulto, vai chegar, desenhando, ao estágio final de crescimento emotivo, intelectual e espiritual. Outro importante legado dessa fase é que o desenho evolui com a idade, das formas mais simples (os rabiscos conhecidos como garatujas) para as mais complexas.
Brincando de ser artista
É interessante que as crianças sejam instigadas a observar os próprios desenhos,que devem ficar  expostos nos corredores, e a apreciar obras de arte e catálogos de propaganda ou encontrar, em fotografias, partes da escola. "O objetivo é ampliar a capacidade de observar e compreender as artes visuais.
As classes do Infantil II (4 e 5 anos) devem fazer passeios em galerias, museus e outros locais.Pois essas crianças de tanto treinar o olhar para as especificidades das obras (o jeito de pintar, os materiais utilizados, as formas e cores), elas muitas vezes conseguem produzir desenhos no estilo da obra apreciada. O  papel do professor deixar claro para a turma que a proposta do trabalho não é copiar o artista. "O que importa é pegar idéias e se inspirar. Assim, os pequenos aprendem a dominar o traço ao tentar adaptar o estilo.
A importância do desenho na pré-escola
Ensinar a turma a desenhar exige oferecer contato permanente com a produção artística de diferentes lugares e épocas para ampliar o olhar

Mudança de conceitos


A postura do professor também muda. Se na tradicional o papel era pedir a cópia, e na renovada, abrir espaço para o desenho livre, agora é fundamental garantir que a turma aprenda sobre o desenho e também tenha espaço para escolher o que fazer. O principal ensinamento é que devemos ter uma visão mais ampla do que é arte visual, para além de telas e desenhos no papel. Fotos, outdoors, esculturas, instalações, objetos do cotidiano e histórias em quadrinho são parte da cultura visual e merecem ser trabalhados em sala. Você pode ainda levar rótulos de embalagens, chamar a atenção para a marca das roupas, dos tênis e das mochilas e montar um espaço para gibis, revistas e catálogos. Fora dos muros escolares, uma boa pedida é ver o estilo de numeração das casas.

Outra reorientação conceitual se dá na forma de apresentar os artistas. Ao falar de Alfredo Volpi, por exemplo, é mais importante ater-se à exploração da imagem, mergulhar em suas formas e cores e passar informações relevantes, como a de que ele foi um pintor de paredes. Só fazer com que a meninada reproduza suas telas cheias de bandeirinhas não acrescenta nada à aprendizagem.
Com a mão na massa

Para criar um ambiente tranqüilo e relaxado,  deixar todos observarem os quadros e fazerem comentários com os colegas.
Evolução do trabalho
Assim como não é recomendável apresentar obras de arte com base na estética do bonito ou feio, não é papel da escola avaliar os desenhos o mesmo esse critério. "Esse tipo de avaliação pode causar uma inibição difícil de reverter", diz o professor Cheida Sans. A melhor forma de acompanhar os avanços é evitar comparações e apenas observar o percurso de cada um e suas progressões. Sim, as crianças podem (e devem) evoluir no dia-a-dia, com a supervisão do professor (acompanhe nos quadros desta reportagem duas experiências bem-sucedidas com desenho na pré-escola, uma em Belo Horizonte e outra em Salvador).

Bons caminhos para fazer a turma evoluir incluem planejar atividades que ajudem a desenvolver o olhar, como observar ambientes, fotos, imagens de computador e histórias em quadrinhos; promover conversas sobre o fazer artístico; apresentar artistas e suas obras e, claro, oferecer uma ampla gama de materiais (giz de cera grosso, massinha, pincel, revistas, jornais, catálogos de propaganda, tesoura sem ponta, cola em bastão) e suportes de diferentes tamanhos (papel craft, papel sulfite, panos, painéis, cartolina, tecido, areia, chão, parede).

Os especialistas dizem ainda que é recomendável fazer intervenções no papel: colar figuras ou iniciar traços, para todos completarem. Da mesma forma, o diálogo com outras artes ajuda muito. Dramatizar uma obra ou colocar uma música de época torna o clima mais propício ao desenvolvimento do grupo. Finalmente, é essencial ampliar o contato com obras de arte, seja em visitas a exposições (com objetivos claros, para o antes, o durante e o depois), seja em ateliês de artistas locais.

Se você tem crianças com deficiência na sala, algumas dicas podem ser úteis. Usar uma fruta para explicar uma natureza-morta para cego, por exemplo. Fazer maquetes em relevo com os elementos do quadro usando EVA, lixa ou tapete permite que todos sintam as texturas. "Inclusão não é ter a criança na classe e ponto. É preciso que suas necessidades de aprendizado sejam contempladas", diz a arte-educadora Amanda Fonseca Tojal, coordenadora do Programa Educativo Públicos Especiais da Pinacoteca do Estado de São Paulo.







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